Boatos de Primavera (Poema), de Carlos Drummond de Andrade

BOATOS DE PRIMAVERA Chegou a primavera? Que me contas! Não reparei. Pois afinal de contas nem uma flor a mais no meu jardim, que aliás não existe, mas enfim essa ideia de flor é tão teimosa, que no asfalto costuma abrir a rosa e põe na cuca menos jardinília um jasmineiro verso de Cecília. Como sabes, então, que ela está aí? Foi notícia que trouxe um colibri ou saiu em manchete no jornal? Que boato mais bacana, mais genial, esse da primavera? Então eu topo, e no verso e na prosa, eis que galopo, saio gritando a todos: Venham ver a alma de tudo, verde, florescer! Mesmo o que não tem alma? Pois é claro. Na hora de mentir, meu São Genaro, é preferível a mentira boa, que o santo, lá no céu, rindo, perdoa, e cria uma verdade provisória, macia, mansa, meiga, meritória. Olha tudo mudado: o passarinho na careca do velho faz se
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